Gosto de andar por ai. Pelo simples faro da curiosidade ou
pelo dom da visita inconsequente. Nasci numa província de cachoeiras,
matagais-corredores, barro-pedregulhos, pinguelos-pontes. Sempre gostei disso,
seja pra jogar bola no campinho de areia, nadar no rio, chegar pedalando e
suado no horto florestal e subir morro acima, de onde podia ver meu
contentamento, meu destino e minha ousadia.
Deixava a noite cair, mesmo sabendo do castigo no dia
seguinte, só pra ver, por entre as árvores, a cidade nascer-pulsar e as luzes
acenderem nova vida desconhecida. No céu, a mancha-mapa clareava a escurão em
universo. Passaram-se décadas e continuo conquistando,
memória após memória, caminhada após caminhada, histórias que percorrem meus
personagens diários. Lembranças que me permitem respirar mais leve, dormir mais
tranquilo, acordar mais desperto e sonhar mais são.
Em minhas caminhadas atrás do trabalho, da grana, da paixão
e do prazer, marco em meu excel imaginário as casas e lugares visitados,
conquistados e convidados, desde que fui ao centro sozinho, renovar meus
documentos e virar estatística. Existem lugares que passo e reverencio. Há
outros que tento puxar da gaveta trancada. Há meu castelo-casa, onde destravo
meus sonhos, onde convivo com meus novos protetores-parceiros.
Mas a verdade fulminante, como a vida assim é, me faz girar
a cadeira e pousar, suavemente, os olhos sobre as noites passadas com muita
música, gargalhadas, histórias, mentiras e amores. Existe algo inocentemente
estranho no passado que nos abandona. Faz falta! Como faz falta algumas pessoas
que conheci e me afastei, casualmente. Chamo todos eles de “mestres dos
sonhos”. Pessoas cheias de vida, inocência, alegria, intensidade, verdade,
prazer, suavidade, imensidão, aprendizado, ousadia. Que, a mim, atingiram uma
só vez, mas transformaram, para sempre, minha vida.
Muitas vezes, poderia ter parado em frente às suas casas,
apertado a campainha. Algumas vezes parei, e isso fez toda a diferença. Outras
vezes não parei, apenas segui em frente. Ah! Meus velhos amigos! Lembro das
noites de portas fechadas e garrafas abertas. As viagens, os jantares na madrugada.
Noites que aguçaram meu paladar e afiaram meus ouvidos.
Caminhamos demais, todos os dias. Atravessamos estações,
pulamos décadas. Por isso recuso a despedir-me de qualquer pessoa que tenha
encontrado nesta estrada. Gosto de deixar minhas pousadas por aí, abertas à
visitação. Quero continuar nossos encontros de almoço, nossas tardes de
mormaço, nossas noites recém-criadas.
Um comentário:
Se aproxegue, pique o fumo, e fique calado se quiser, se não quiser, fale, ou então pense alto...
Saudação lá dos pampas de onde venho, ou de onde saí a muito tempo, também como tu, eu ando pelo tempo, com mais idade, e menos andanças, talvez com os mesmos anseios.
Postar um comentário